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O PAPEL MODERADOR DO GÉNERO NA RELAÇÃO ENTRE O
WORKAHOLISM E O CONFLITO TRABALHOFAMÍLIA/FAMÍLIA
TRABALHO E AS SUAS IMPLICAÇÕES AO NÍVEL DO BEMESTAR
THE MODERATING ROLE OF GENDER IN THE RELATIONSHIP BETWEEN
WORKAHOLISM AND THE WORKFAMILY/FAMILYWORK CONFLICT AND ITS
IMPLICATIONS FOR WELLBEING
Tiago Encarnação
1
, Cátia Sousa
2
PSIQUE • EISSN 21834806 • VOLUME XIX • ISSUE FASCÍCULO 1
1
ST
JANUARY JANEIRO  30
TH
JUNE JUNHO 2023 PP. 109142
DOI: https://doi.org/10.26619/2183-4806.XIX.1.6
Submitted on 6.09.21 Submetido a 6.09.21
Accepted on 29.12.22 Aceite a 29.12.22
Resumo
Atualmente são imeras as transformações verificáveis nos diferentes setores da sociedade.
A família e as expectativas que as empresas colocam sobre os seus funciorios, através das ele-
vadas exigências, são noções que merecem particular atenção dada a necessidade de estabelecer
um ponto de equilíbrio entre estas vertentes de inclusão. A impossibilidade de complementar os
domínios familiar e laboral correlaciona-se fortemente com o workaholism, traduzindo-se esta
simbiose em consequências no bem-estar dos trabalhadores. Dado a sua relevância, este estudo,
de caráter quantitativo ilustra como principais objetivos: 1) observar o efeito do workaholism
sobre o conflito trabalho-família/família-trabalho; 2) verificar o efeito destas varveis sobre o
bem-estar; 3) observar o papel do género enquanto moderador das relações entre o workaholism
e o conflito trabalho-família/família-trabalho; o workaholism e o bem-estar; o conflito trabalho-
-família/família-trabalho e o bem-estar. Tendo por base uma amostra constituída por 321 partici-
pantes, sendo 187 do sexo feminino e 130 do sexo masculino com idades entre os 18 e os 68 anos
(M = 36.54; DP = 11.67), os resultados evidenciaram que o workaholism e o conflito trabalho-fa-
mília são preditores significativos do bem-estar e que o workaholism influencia o conflito traba-
lho-família. Ao nível do género, verificaram-se somente diferenças estatisticamente significati-
vas na variável workaholism e respetivas dimensões, apresentando os homens valores de média
1 Universidade do Algarve, Faro, Portugal. Licenciado em Psicologia, estudante do mestrado em Psicologia Social, do Trabalho
e das Organizações, Universidade do Algarve. a67320@ualg.pt
2 Universidade do Algarve, Faro, Portugal. Centro de Investigação em Psicologia (CIP/UAL) & Universidade do Algarve
Licenciada em Gestão de Recursos Humanos, Mestre em Ciências do Trabalho e Relações Laborais e doutorada em Psicologia.
Professora Adjunta convidada na Escola Superior de Gestão, Hotelaria e Turismo da Universidade do Algarve e membro do
Centro de Investigação em Psicologia (CIP/UAL) & Universidade do Algarve.
cavsousa@ualg.pt | http://orcid.org/0000-0001-9905-8138
Financiamento: Este trabalho foi financiado com fundos nacionais através da FCT – Fundação para a Ciência e Tecnologia – no
âmbito do projeto CIP / UAL – Ref.ª UID / PSI / 04345/2020
Autor correspondente: Tiago Encarnação, a67320@ualg.pt
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superiores comparativamente às mulheres. É imperativo que as empresas atentem à necessidade
de estabelecer um conjunto de metodologias que visem a conciliação entre domínios, prevenindo
e evitando comportamentos de excesso e implementando práticas que promovam o bem-estar do
seu capital humano.
Palavras-chave: Workaholism; conflito trabalho-família e família-trabalho; bem-estar; género
Abstract
Currently, there are countless changes that can be verified in different sectors of society. The
family and the expectations that companies place on their employees, through the high demands,
are notions that deserve particular attention given the need to establish a balance point between
these aspects of inclusion. The impossibility of complementing the family and work domains
is strongly correlated with workaholism, translating this symbiosis into consequences for the
well-being of workers. Given its relevance, this quantitative study illustrates the following main
objectives: 1) to observe the effect of workaholism on the work-family/family-work conflict; 2)
verify the effect of these variables on well-being; 3) observe the role of gender as a moderator of
the relationship between workaholism and work-family/family-work conflict; workaholism and
well-being; the work-family/family-work conflict and well-being. Based on a sample consisting
of 321 participants, 187 female and 130 male, aged between 18 and 68 years (M = 36.54; SD =
11.67), the results showed that workaholism and work- family are significant predictors of well-
being and that workaholism influences work-family conflict. At the gender level, there were only
statistically significant differences in the workaholism variable and its dimensions, with men
showing higher mean values compared to women. It is imperative that companies pay attention
to the need to establish a set of methodologies aimed at reconciling domains, preventing and
avoiding excessive behavior and implementing practices that promote the well-being of their
human capital.
Keywords: Workaholism; work-family and family-work conflict; well-being; gender
Nos finais do século XX, o processo de globalização e a introdução de novas tecnologias
constituíram um marco determinante no desenvolvimento da sociedade, induzindo um maior
senso de competitividade (Silva & Ferreira, 2013). Neste sentido, o trabalho assumiu inevitavel-
mente um papel de destaque na vida das pessoas. As novas tecnologias permitiram uma evolu-
ção substancial do ser humano nos mais diversos contextos nomeadamente a nível social, cul-
tural e biológico (Camelo & Angerami, 2008), no entanto esta progressão fez-se acompanhada
por consequências manifestas em termossicos e emocionais. Socialmente a relencia do tra-
balho é verificável mediante um conjunto de necessidades impostas como a sobrevivência, os
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relacionamentos interpessoais e a autodeterminação (Blustein, 2008). De acordo com o referido é
possível afirmar que a ausência de trabalho poderá constituir-se como um fator responsável pelo
surgimento de problemas de saúde mental (Lucas et al., 2004; Vinokur et al., 2000).
A manutenção de um estilo de vida agradável e o recorrente decréscimo salarial são alguns
exemplos que incitam os indivíduos a despender horas extra à sua atividade laboral para além
do exigido (Porter & Kakabadse, 2006), caraterizando-se deste modo como workaholics (Cheung
et al., 2018). Estes sujeitos devido à sua obsessão pelo trabalho são incapazes em estabelecer um
ponto de equilíbrio entre a esfera laboral e familiar despriorizando a imporncia desta última
(Tahir & Aziz, 2019). A compulsão enquanto caractestica comum, remete para a experienciação
de conflito trabalho-família, que tem repercuses tanto na saúde física como psicológica (Tahir
& Aziz, 2019).
O conflito trabalho-família traduz a inexistência de um equilíbrio entre o panorama laboral
e familiar (Csikszentmihalyi, 2003). A gestão das responsabilidades é uma tarefa árdua na socie-
dade moderna, dado as exigências impostas por cada domínio, os sujeitos deparam-se com a
necessidade de gerir inúmeras responsabilidades, direcionando os seus recursos exclusivamente
para estas vertentes de inserção (Fotiadis et al., 2019). Dito isto, os principais fatores responsá-
veis pelo surgimento de conflito trabalho-família remetem para o burnout, insatisfação, stress
laboral, horas excessivas de trabalho e conflito de papéis (Bakker et al., 2005; Ford et al., 2007;
Kossek & Ozeki, 1998; Spector et al., 2004). O conflito de papeis afeta não só a produtividade do
trabalhador como também o seu desempenho, reduzindo os seus níveis satisfacionais (Johnson et
al., 2005). A satisfação dos trabalhadores suscita um maior senso de produtividade, neste sentido
as organizações procuram ativamente envolver-se na vida familiar dos seus funcionários, a fim
de encontrar soluções que sejam viáveis (Obrenovic et al., 2020). As empresas devem tomar em
consideração o bem-estar dos seus colaboradores disponibilizando ferramentas que auxiliem a
conciliação da vida profissional e familiar, assim será de esperar que o desempenho do trabalha-
dor e a sua saúde mental aumentem (Fitzpatrick et al., 2012).
Face à importância desta temática para as organizações e para o bem-estar dos seus recursos
humanos, este estudo apresenta como principais objetivos: 1) observar o efeito do workaholism
sobre o conflito trabalho-família/família-trabalho; 2) analisar o efeito destas variáveis sobre o
bem-estar; 3) observar o efeito moderador do género nas relações entre: workaholism e o conflito
trabalho-família/família-trabalho, workaholism e o bem-estar; conflito trabalho-família/família-
-trabalho e o bem-estar.
1. Workaholism
Determinadas pessoas tendem a sofrer a influência de fatores internos ou externos, que as
levam a despender de uma forma compulsiva e excessiva, mais horas de trabalho do que aquelas
que são expectáveis para com as suas responsabilidades laborais. Deste modo é legítimo classifi-
-las como workaholics (Schaufeli et al., 2008a). Para ser considerado como uma pessoa workaho-
lic é necessário a presença de determinadas caraterísticas únicas, nomeadamente uma forte
obsessão pelo trabalho de tal maneira que este acaba por ultrapassar aquelas que são as van-
cias do indivíduo, comprometendo a sua saúde, felicidade, funcionamento social e até mesmo a
capacidade de estabelecer relacionamentos com os outros (Oates, 1971).
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Schaufeli et al. (2008b) contempla a existência de duas componentes do conceito: trabalho
excessivo e trabalho compulsivo que acabam por se correlacionar com a definição proposta por
Oates (1971). Estes teóricos constataram que o workaholism tem um efeito negativo em termos
individuais em diversas vertentes. É de salientar a inexistência de relacionamentos interpes-
soais no meio laboral em virtude da procura constante em controlar as suas próprias ações e
a ausência da capacidade de delegação. Desta feita torna-se legítimo afirmar que os sujeitos,
ao disporem tempo extra em atividades relacionadas com o trabalho, têm mais dificuldade em
dedicar tempo a outro tipo de atividades o que acaba por limitar os laços familiares, contribuindo
negativamente para as relações conjugais (Giannini & Scabia, 2014).
Apesar de grande parte dos investigadores considerar este atributo como um vício (Clark et
al., 2016), está patente a escassez de um consenso na comunidade investigadora relativamente ao
conceito em si, sendo evidente alguma incoerência no que concerne à sua natureza e definição
(McMillan & O’Driscoll, 2006).
O termo workaholism foi alvo de alguma discordância, ou seja, alguns autores considera-
vam-no como sendo algo positivo (Korn et al., 1987; Machlowitz, 1980; Sprankle & Ebel, 1987),
enquanto outros o encaravam como negativo (Killinger, 1991; Oates, 1971; Porter, 2001; Schaef &
Fassel, 1988). Segundo estes teóricos, os workaholics manifestam uma enorme obsessão e senti-
mentos de tristeza, dado a sua incapacidade em estabelecer bons relacionamentos com os seus
colegas e de exercer as suas funções da melhor maneira possível. Os autores defensores enfati-
zaram o benefício destes tipos de sujeitos para as organizações, dado a sua procura intensa pelo
trabalho no alcance de níveis satisfatórios, através das suas práticas laborais (Schaufeli et al.,
2006). Outros teóricos, em sentido oposto, consideraram que este conceito representa uma adição
associada ao termo alcoolismo e como tal é encarada de uma maneira negativa (Schaufeli et al.,
2006). Numa terceira vertente temos ainda aqueles que apostam a sua confiança na existência
de ambos os tipos de workaholism, estabelecendo um panorama diferenciador entre as formas
positiva e negativa do grande investimento no trabalho (Schaufeli et al., 2006).
1.1. Caraterísticas de um workaholic
Alguns investigadores reaaram o estabelecimento de um número espefico de horas de
trabalho na distinção dos trabalhadores workaholic dos não workaholic (Mosier, 1983), enquanto
que outros consideraram que a atitude do trabalhador relativamente às suas funções assume
uma enorme imporncia na definição do workaholism, como por exemplo o investimento exce-
dentário da sua energia e tempo em tarefas laborais que vão para além daquilo que é requerido
(Mudrack, 2004; Ng et al., 2007; Spence & Robbins, 1992).
Porter (1996) considerou a existência de seis caraterísticas fundamentais na identificação de
um indivíduo workaholic, são elas: trabalhar de forma excessiva desconsiderando o seio fami-
liar e os relacionamentos sociais, distorção do seu autoconceito, perfeccionismo, experiência
de ansiedade quando fora do contexto de trabalho, procura intensiva por trabalho extra que
permita o desenvolvimento da sua autoestima e a não aceitação da sua obsessão pelo trabalho.
Spence e Robins (1992), estabeleceram que o sujeito workaholic é portador de um conjunto de
atributos. Definiram e mediram-no, tornando possível a conceção de três dimensões: work invol-
vement- que representa o comprometimento dos trabalhadores com o seu trabalho bem como o
tempo envolvido; drive- diz respeito às pressões internas que conduzem o indivíduo a trabalhar;
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Workaholism, conflito trabalho-família e bem-estar
enjoyment of work- traduz-se pelo prazer proporcionado pela atividade laboral em si. Estas três
dimenes conceptualizam-se enquanto a tríade workaholic, sendo que a partir delas os autores
instituíram uma tipologia.
Em linha com o referido, Bakker et al. (2014) propuseram três dimensões que facilitam a
identificação de um workaholic: a primeira remete para o facto de que estes sujeitos trabalham
arduamente; a segunda diz respeito à sua compulsividade; e a terceira é referente ao facto de
trabalharem para além do requerido.
1.2. Consequentes do Workaholism
Os estudos desenvolvidos em torno desta temática, associam na sua maioria o conceito a
aspetos negativos, apresentando o workaholism como responsável pela diminuição do bem-es-
tar geral (Burke, 2000; Burke et al., 2004; McMillan et al., 2001). Verificou-se igualmente que na
vertente do conflito trabalho-família prevalecem maiores níveis de conflito em indivíduos consi-
derados workaholic (Aziz & Zickar, 2006; Bakker et al., 2009; Bonebright et al., 2000; Brady et al.,
2008; Buelens & Poelmans 2004; Robinson et al., 2001; Robinson & Post, 1997). Clarke et al. (2016)
demonstraram que o conceito se implementa por meio de manifestações negativas como proble-
mas de sono (Ariapooran, 2019; Salanova et al., 2016), burnout (Bakker et al., 2009; Cheung et al.,
2018; Dobrowolska et al., 2018) e conflito trabalho-família (Taris et al., 2005; Tahir & Aziz, 2019;
Torp et al., 2018). Noutros contextos evidencia-se níveis de saúde mental baixos, perfeccionismo
e até mesmo desconfiança entre colegas (Ng et al., 2007). As horas extra de trabalho remetem
para uma maior exposição a condições de stress, sendo de salientar aqueles que auferem de uma
performance alta (Gomes, 2011)
Os indivíduos workaholic apresentam níveis de bem-estar psicológico baixos e elevados índi-
ces de stress quando é estabelecido um termo comparativo com os sujeitos que não sofrem deste
vício (Brummelhuis & Rothbard, 2018; Caesens et al., 2014; Shimazu et al., 2015; Taris et al., 2005).
Ainda sobre esta temática, Shimazu e Schaufeli (2009) verificaram a existência de uma associa-
ção positiva do workaholism com o distress psicológico, estabelecendo-se em sentido inverso uma
relação negativa com a satisfação com a vida e a satisfação familiar. Mais recentemente, Kara-
pinar et al. (2020) observaram que a relação entre o workaholism e o bem-estar é mediada pelo
conflito trabalho-família.
2. Conflito trabalho-família
Segundo Greenhaus e Beutell (1985) o conflito trabalho-família/família-trabalho representa
a incapacidade de um determinado sujeito em gerir as pressões adjacentes aos domínios laboral
e familiar, em virtude da incompatibilidade entre ambos. Quer isto dizer que o papel familiar do
indivíduo e as suas imposições, impedem um bom desempenho daquilo que são as suas respon-
sabilidades laborais.
Estes mesmos autores estipularam que o conflito pode ser dividido em três tipos: 1) o conflito
baseado no tempo, que sucede nomeadamente quando as obrigações impostas num dos domí-
nios, utilizam tempo que se revela necessário para o cumprimento das responsabilidades no
outro domínio; 2) o conflito baseado na tensão que ocorre em situações de stress, decorrentes de
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acontecimentos numa das esferas, e que de certa maneira podem influenciar o cumprimento do
papel do indivíduo na outra esfera; 3) o conflito baseado no comportamento, que surge quando
se verifica uma incompatibilidade de comportamentos nos papéis do sujeito em ambos os meios
(Greenhaus & Beutell, 1985).
Carlson et al. (2000) denotaram que o constructo apresentava um caráter unidimensional,
porém com os avanços estabelecidos este assumiu uma natureza bidirecional (Greenhaus &
Powell, 2006). Desta forma, o conflito existente pode ser estabelecido tendo por base duas pers-
petivas: o conflito trabalho-família no qual as obrigações laborais impedem um bom desempe-
nho do papel familiar do indivíduo e o conflito família-trabalho em que as responsabilidades
familiares dificultam o cumprimento das suas funções laborais (Frone et al., 1992; Netemeyer et
al., 1996).
Atualmente qualquer indivíduo que possua uma vida laboral depara-se constantemente com
dificuldades para conseguir gerir as suas responsabilidades tanto na esfera profissional como
familiar. Algo que possui um enorme valor e que se constitui como determinante é o incremento
de famílias em que ambas os cônjuges trabalham, sendo de igual modo uma realidade cada vez
mais presente, os pais solteiros trabalhadores (Duxbury & Higgins, 1994). Perante a introdução
das novas tecnologias no meio social, os horários padrão deixaram de ser uma realidade viável,
destacando-se a incapacidade em separar aquilo que é a vida profissional da vida familiar. Dado
que as responsabilidades de um domínio interferem com as do outro, instala-se o chamado con-
flito-trabalho-família/família-trabalho.
Perante esta questão os sindicatos têm procurado encontrar soluções, pedindo às empresas a
criação e implementação de ambientes laborais que levem em consideração o contexto familiar
dos trabalhadores, através de políticas amigas da família facilitadoras (Frone, 2003).
Um dos principais focos da criação de um ambiente laboral amigo da família prende-se com
a possibilidade de os colaboradores balancearem os meios de inserção, reduzindo assim o con-
flito adjacente, bem como os outcomes negativos que d poderão advir. Neste sentido, deverão
ser estabelecidos um conjunto de práticas a serem implementadas em termos organizacionais.
Estas por sua vez podem se aglomerar em dois grupos: programas, políticas bem como benefí-
cios trabalho-família que envolvem desde logo flexibilidade horária, teletrabalho, semanas de
trabalho comprimidas, partilha de responsabilidades laborais, assistência a dependentes através
de serviços de cuidados infantis ou de idosos e os serviços de recursos; numa outra classe uma
cultura organizacional favorável que faculte uma perceção de apoio que vai desde os superviso-
res aos pprios colegas de trabalho como também a redução das conseqncias negativas para
a carreira, aliadas ao uso destas vantagens (Flye et al., 2003; Frone, 2003).
2.1. Antecedentes e consequentes do conflito trabalho-família
O referencial teórico sugere a existência de uma vasta panóplia de variáveis como possíveis
antecedentes associados ao conflito trabalho-família/família trabalho. Desta forma Byron (2005)
propôs a divisão dessas variáveis tendo por base três categorias: variáveis do domínio do traba-
lho que dizem respeito ao envolvimento no trabalho, stress laboral e flexibilidade horária. Byron
(2005) salienta que os níveis elevados de envolvimento laboral, stress bem como horas exceden-
rias contribuem para o aumento dos níveis de conflito trabalho-família, contudo a capacidade
em proporcionar horários flexíveis e suporte no trabalho tanto da parte dos superiores como dos
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Workaholism, conflito trabalho-família e bem-estar
próprios colegas poderão de certa maneira amenizar os efeitos negativos do conflito de papéis; as
variáveis do domínio extratrabalho que remetem para o conflito familiar, idade dos filhos mais
novos, stress familiar, apoio familiar e estado civil. Para o autor todas estas vertentes poderão
aumentar o nível de conflito, sendo tal reversível por via do envolvimento familiar e do tempo
despendido noutros contextos; por fim as variáveis demográficas e individuais que se traduzem
em termos de género, rendimento, estratégias de coping e competências.
O estado de arte estabelece que o conflito trabalho-família se associa de forma negativa ao
bem-estar (Amstad et al., 2011; Deng & Gao, 2017; Hagqvist et al., 2017; Knecht et al., 2011; McNall
et al., 2010). É inclusivamente notório que os elevados níveis de conflito predizem de forma sig-
nificativa os baixos níveis de bem-estar (Grant-Vallone & Donaldson, 2001). Um estudo desenvol-
vido com trabalhadores dos Estados Unidos da América concluiu que o conflito trabalho-família
revela uma associação negativa com o bem-estar e a satisfação com a vida (Cho & Tay, 2016).
Outros estudos revelaram a existência de uma simbiose negativa entre o trabalho e os conflitos
familiares com a satisfação familiar (Burch, 2020; Parasuraman & Simmers, 2001; Huang et al.,
2004). De igual modo constatou-se a existência de uma associação negativa entre o trabalho e os
conflitos familiares com o bem-estar psicológico (Lin et al., 2019; Obrenovic et al., 2020; Yucel &
Fan, 2019) e uma relação negativa entre os conflitos laborais e as famílias com a satisfação conju-
gal (Aycan & Eskin, 2005; Jaenudim et al., 2020; Kim & Ling, 2001; Yucel, 2017a; Wulandari et al.,
2019).
Segundo Greenhaus e Allen (2011) o conflito trabalho-família produz consequências que são
categorizáveis em três níveis: 1) experiências laborais- o conflito trabalho-família relaciona-se
em primeira instancia com o decréscimo dos níveis de satisfação profissional, o envolvimento
organizacional, os índices de turnover (Chan & Ao, 2019; Mumu et al., 2021; Netemeyer et al.,
1996), o burnout (Peeters et al., 2005), o absentismo (Kirchmeyer & Cohen, 1999) e o stress decor-
rente do trabalho (Ekawarna, 2019; Netemeyer et al., 1996); 2) caraterísticas pessoais e disposi-
ções- no que diz respeito às consequências inerentes ao domínio familiar, o conflito trabalho-fa-
mília é responsável pelo decréscimo da satisfação conjugal (Yucel, 2017b), da satisfação familiar
(Cardenas et al., 2004) apresentando-se igualmente neste panorama o stress imposto pela família
(Swanson & Power, 1999); 3) experiências familiares- associam-se ao bem-estar, neste sentido o
conflito é responsável pela redução da satisfação com a vida (Cazan et al., 2019; Greenhaus et al.,
2003), stress psicológico (Bilodeau et al., 2020; Kelloway et al., 1999), depressão (Vinokur et al.,
1999; Zhou et al., 2018) e um incremento do consumo de substâncias aditivas como o tabaco ou o
álcool (Allen et al., 2000).
3. Bem-estar
O início do século XXI é marcado por diversas alterões, visíveis não só a nível social como
também no contexto laboral (Blustein, 2006; Duffy et al., 2016). Neste sentido desencadeou-se
um estímulo competitivo por parte das organizações, face aos rápidos progressos económicos,
prevalecendo a necessidade de facultar um ambiente de trabalho próspero para os seus colabo-
radores (Vakola et al., 2004). As mudanças impostas por sua vez exigem a contratação de funcio-
rios que facilmente se adaptem aos contextos de transição, beneficiando a produtividade e o
bem-estar da mesma (Vakola et al., 2004).
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São inúmeros os conceitos atribuídos ao termo bem-estar, assim torna-se relevante a expla-
nação das diferentes tipologias existentes, nomeadamente aquelas que enfatizam um conjunto
de questões fulcrais que vão ao encontro da temática em estudo como a satisfação com a vida e os
aspetos físicos, psicológicos e emocionais ligados à saúde com particular incidência na qualidade
de vida laboral (Oliveira et al., 2020).
O bem-estar subjetivo representa a maneira como as pessoas analisam a sua própria vida,
sendo que as reações de caráter emocional e os julgamentos relativos à satisfação com a vida
envolvem diferentes vertentes tais como a vida laboral e o casamento (Oliveira et al., 2020).
Este por sua vez dispõe de uma forte relação com o hedonismo filosófico, ou seja, apresenta-se
enquanto um sinónimo do prazer e da felicidade (Ryan & Deci, 2001).
O bem-estar hedônico (Watson et al., 1988) traduz-se por uma medida de avaliação afetiva,
a qual pode ser positiva ou negativa, e uma avaliação cognitiva da satisfação com a vida (Diener
et al., 1985). Paschoal e Tamayo (2008) salientam que o bem-estar dominado pela felicidade hedô-
nica é encarado como um estado de afetividade predominantemente positiva, concluindo-se que
a subjetividade do conceito apresenta uma estreita relação com as sensações e emoções expe-
rienciadas pelo sujeito no decorrer da sua vida.
O bem-estar psicológico por outro lado focaliza-se no desempenho das aptidões dos sujei-
tos, incluindo dimensões como a autoaceitação, relacionamentos positivos, autonomia, domínio
ambiental, sentido de vida e desenvolvimento individual (Zheng et al., 2015). Este termo espelha
o eudemonismo, sendo, no entanto, notório o criticismo em torno das definições desta teoria que
colocavam em causa as conceções que serviam de amparo ao bem-estar subjetivo (Siqueira &
Padovam, 2008)
Spreitzer et al. (2005) destacam que boas interações laborais envolvidas por um ambiente
de confiança e de respeito associam-se fortemente ao bem-estar eudaimônico. Esta conceção
(Ryan & Deci, 2001) debruça-se sobre o funcionamento ideal, autorrealização, significado da vida
(Morgan & Farsides, 2009), propósito (Waterman et al., 2010) e desenvolvimento (Diener et al.,
2010). O bem-estar eudaimônico enaltece o contexto de trabalho como um local onde prevalecem
conceitos como a saúde e o bem-estar, favorecendo o crescimento e a prosperidade (Di Fabio &
Kenny, 2019). Os sujeitos apresentam um maior envolvimento com o seu trabalho nomeadamente
quando sentem o apoio e preocupação dos seus líderes.
O bem-estar no local de trabalho é um tópico da atualidade que merece um enorme destaque
em termos de pesquisa (Danna & Griffin, 1999; Karapinar et al., 2020). Os indivíduos contactam
com imeras realidades no seu meio laboral, experienciando situações diversas que de certo
modo acabam por interferir com o seu desempenho, o que poderá ter repercussões noutras esfe-
ras da vida do trabalhador (Simone, 2014).
Sirgy (2006) considera que o bem-estar laboral se manifesta através de sentimentos de satis-
fação, felicidade e bem-estar subjetivo e que se associa de certo modo à satisfação do sujeito com
o seu local de trabalho. O bem-estar-laboral é um estado que abrange não só os colaboradores
como também os superiores e a economia. É igualmente visto como uma fonte promotora de
competitividade organizacional, relacionando-se com as experiências positivas dos trabalhado-
res (Pereira et al., 2012; Sant’Anna et al., 2012). Ou seja, a produtividade do colaborador apresenta
uma forte dependência dos seus índices físicos e psicológicos.
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Workaholism, conflito trabalho-família e bem-estar
3.1. Antecedentes e consequentes do Bem-estar
Carvalho et al. (2019) sustentam que o modelo de trabalho moderno, fomentado pela compe-
titividade e pelas exigências, traduz-se num maior dispêndio temporal nas tarefas profissionais,
o que por si constitui um conflito relativamente ao tempo consumido pelos domínios profissio-
nal e familiar. As novas tecnologias possibilitam aos trabalhadores a conexão ao seu local de tra-
balho a partir de qualquer lugar, elevando desta feita as exigências das chefias na realização das
atividades respeitantes ao seu cargo. Problemas ao nível da saúdesica, psicológica e emocional
bem como stress são alguns exemplos de consequências resultantes deste processo (Carvalho et
al., 2019).
Os sujeitos que exibam níveis de felicidade superiores manifestam por sua vez mais saúde
física/psicológica e mais longevidade (Lyubomirsky et al., 2005a, b; Roysamb et al., 2003), apre-
sentam uma melhor performance e adaptam-se facilmente a circunsncias que consequente-
mente lhes permitem encarar situações de stress de uma outra perspetiva (Wood & Joseph, 2010).
Um estudo desenvolvido por Carvalho et al. (2019) engloba o aumento das exigências de traba-
lho, a competição existente entre trabalhadores, o desemprego e a requisição de competências
individuais como as causas responsáveis pelo mal-estar individual dos colaboradores. As autoras
enfatizam que a vida profissional ocupa um lugar determinante no investimento praticado pelos
sujeitos, ou seja, o reconhecimento da dedicação pelo trabalho desenvolvido é fundamental na
experiência de sensações de prazer no desenvolvimento das atividades da sua responsabilidade
aliado ao bem-estar e a bons índices de saúde no meio de trabalho. Conclui-se que as exigências
profissionais, o workaholism e o conflito trabalho-família são variáveis suscetíveis de influenciar
o bem-estar dos colaboradores (Karapinar et al., 2020; Obrenovic et al., 2020; Thair & Aziz, 2019;
Zhang et al., 2020).
Para além do referido, nas relações laborais expressas pela positividade verifica-se uma
maior satisfação por parte dos trabalhadores em relação ao seu trabalho (Boehm & Lyubomirsky,
2008; Connolly & Viswesvaran, 2000). Assim é de notar que os indivíduos com maiores índices
de bem-estar tendem a apresentar um melhor desempenho e a cooperar com maior facilidade
(George, 1991), evidenciando-se relacionamentos satisfatórios, menos problemas de sono, menos
burnout, mais autocontrolo e maiores níveis de satisfação (Carleton & Barling, 2017; Diener &
Seligman, 2002; Chida & Steptoe, 2008; Hirsche & Gondim, 2020; Morera et al., 2020; Weziak-Bia-
lowolska et al., 2020).
De acordo com o evidenciado pela literatura, delinearam-se as seguintes hipóteses de inves-
tigação:
H1: O workaholim influencia o conflito trabalho-família e família-trabalho.
H2: O workaholim influencia o bem-estar.
H3: O conflito trabalho-família e família-trabalho influencia o bem-estar.
4. Diferenças de género
O equilíbrio da vida do sujeito associa-se estreitamente ao conflito trabalho-família/famí-
lia-trabalho (Dilmaghani & Tabvuma, 2019). A incapacidade para gerir os papéis de ambas as
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esferas, traduz-se em desequilíbrios, que por sua vez implicam níveis de produtividade baixos,
elevadas taxas de absentismo, ausência de satisfação laboral e de bem-estar (Georgellis et al.,
2012; White et al., 2003).
O género apresenta uma enorme significância no que concerne à competência individual
na coordenação das funções, assumindo um papel moderador que interfere na forma como os
conflitos laborais, as estratégias para lidar com o conflito e a sua manifestação são encaradas
(Higgins et al., 1994). As mulheres apresentam uma extrema dificuldade em equilibrar todas as
suas responsabilidades, não só devido à escassez de tempo, mas também em virtude da ausência
dos seus cônjuges na vida doméstica aliado ao preconceito ainda existente nos locais de trabalho
(Rehman & Roomi, 2012). O conflito experienciado pelos homens destaca a sua atividade laboral
como uma fonte de identidade e de autoestima que inferioriza a importância das suas obrigações
familiares (Karkoulian et al., 2016). Para além disso, as mulheres sofrem a forte influência cultu-
ral que impõe o seu maior envolvimento na vida familiar, distanciando-as da meio profissional
(Watts, 2009). Esta disposição leva os homens a despender horas extra no seu local de trabalho
para além das exigidas, a fim de compensar a não empregabilidade do seu cônjuge, funcionando
igualmente como uma forma de distanciamento à agitação familiar (Watts, 2009).
As investigações desenvolvidas em torno desta questão (Behson, 2002; Bruck et al., 2002;
Frone et al., 1996) evidenciaram que as mulheres tendem a experienciar níveis de conflito fa-
lia-trabalho mais elevados quando comparadas com os homens. Igualmente se comprovou que
as mulheres apresentam índices elevados de conflito trabalho-família, sendo estes superiores
aos experienciados pelos homens (Cinamon & Rich, 2002; Lee et al., 2003). Em sentido contrário,
outros teóricos concluíram que eram os homens que apresentavam mais conflito família-traba-
lho quando comparados com as mulheres, não se verificando, contudo, quaisquer diferenças ao
nível do conflito trabalho-família (Boyar et al., 2005). Um outro estudo, que envolvia casais em
que ambos os cônjuges trabalhavam, efetivou que os homens manifestavam mais conflito traba-
lho-família relativamente às mulheres (Hammer et al., 2005).
São inúmeros os tópicos que destacam as diferenças entre homens e mulheres nesta vertente,
no entanto contatou-se em alguns casos a inexistência de diferenças de género no que diz res-
peito ao conflito de papéis (Aryee et al., 2005; Carnicer et al., 2004; Hammer et al., 2004; Kinnu-
nen, et al., 2004; Simon, et al., 2004). Para além das diferenças de género referenciadas na litera-
tura sobre o binómio trabalho-família, importa também destacar as diferenças no workaholism.
Blair-Loy (2003) defende que as mulheres, em sentido oposto aos homens, enfrentam geralmente
um dilema na escolha do domínio ao qual devem prestar a sua dedicação. Para Ridgeway (2011) o
género é uma identidade passível de influenciar de uma forma consciente ou inconsciente outras
identidades, como a identidade sustentada pela mulher no meio laboral e no meio familiar.
Contudo, as mulheres geralmente apresentam motivação extra para trabalhar, experien-
ciando sentimentos de prazer e stress que se efetivam numa maior dedicação ao trabalho (Spence
& Robbins, 1992). Estes mesmos autores consideraram que os sujeitos do sexo feminino apresen-
tam frequentemente caraterísticas workaholic em virtude das exigências laborais e dos níveis
competitivos patenteados nas requisições de sucesso. Em termos de matéria investigacional não
se verificaram diferenças significativas entre géneros relativamente ao workaholism, observan-
do-se scores similares em ambos os sexos (Aziz & Cunningham, 2008; Bakker et al., 2009; Burke,
1999). Em estudos de autorrelato os resultados foram similares, verificando-se igualmente a
inexistência de diferenças de género relativamente ao workaholism (Aziz & Cunningham 2008;
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Bakker et al., 2009). Ainda nesta vertente, ficou patenteado que as mulheres lidam com um maior
número de responsabilidades quando comparadas com os homens, que se preocupam somente
com o sustento familiar (Blair-Loy, 2010; Ridgeway, 2011). Dito isto, considera-se que o género
poderá influenciar a manifestação workaholic dos sujeitos.
Beiler-May et al. (2017) esclarecem que as diferenças que possam existir entre sexos nos estu-
dos de autorrelato, direcionados à questão do workaholism, dependem da forma como são dadas
as respostas por parte dos inquiridos. Segundo as autoras, as mulheres omitem com frequência a
sua maior dedicação ao trabalho em detrimento das tarefas domésticas. Beiler-May et al. (2017)
destacam a não valorização do workaholism no sexo feminino que se deve em grande parte às
normas culturais. Em suma, pressupõe-se que as mulheres poderão experienciar o workaholism
de uma forma mais acentuada, dado a necessidade de gerir proeminentemente a sua compulsão
para trabalhar e as tarefas domésticas de sua responsabilidade respeitantes à esfera familiar.
Face ao exposto avançou-se a seguinte hipótese:
H4: O género é moderador da relação entre workaholism e o conflito trabalho-família e
família-trabalho.
H5: O género é moderador da relação entre workaholism e bem-estar.
H6: O género é moderador da relação entre conflito trabalho-família e família-trabalho
e bem-estar.
5. Metodologia
5.1. Amostra
A amostra é constituída por 321 participantes, sendo 58.3% (n = 187) indivíduos do sexo femi-
nino e 40.5% (n = 130) do sexo masculino, destacando-se uma pequena parcela de inquiridos 1.6%
(n = 4) que renunciaram à participação. As idades variam entre os 18 e os 68 anos (M = 36.54; DP =
11.67). No que concerne ao número de filhos cerca de 45.5% (n = 146) afirma não ter filhos, 28.3%
(n = 91) tem 1 filho, 20.6% (n = 66) tem 2 filhos, 2.5% (n = 8) tem 3 filhos, 0.9% (n = 3) tem 4 filhos e
2.2% (n = 7) abstiveram-se de resposta. Relativamente ao estado civil, 44.2% (n = 142) são solteiros,
46.4% (n = 149) são casados/união de facto, 8.1% (n = 26) são divorciados e 1.2% (n = 4) dos par-
ticipantes não deu qualquer tipo de resposta nesta secção. Em termos de habilitações literárias
aproximadamente metade da amostra recolhida 48.9% (n = 157) dispõe de ensino secundário, a
licenciatura assume-se como a segunda habilitação com maior abrangência 25.2% (n = 81), 8.7%
(n = 28) tem o ensino básico, 6.2% (n = 20) tems-graduação, 4.0% (n = 13) possui mestrado, 3.7%
(n = 12) detém o ensino primário, 1.9% (n = 6) apresenta doutoramento e 1.2% (n = 4) representa o
conjunto de participantes que não deram qualquer resposta. Quanto à atividade profissional os
dados sugerem que mais de metade dos participantes 72.9% (n = 234) exercem funções laborais
na área da hotelaria, 6.2% (n = 20) trabalha na área da secretaria/administração, 5.0% (n =16) na
área dos serviços, 4.7% (n =15) destaca-se no ensino/educação, 2.8% (n =9) trabalha na área da
saúde, 2.2% (n =7) insere-se na função pública, a área jurídica e da segurança apresentam uma
menor relevância entre os inquiridos tendo sido contabilizados somente 0.6% (n =2) e 0.9% (n
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=3) respetivamente, 4.7% (n = 15) dos sujeitos abrangidos abstiveram-se de resposta. Quanto à
instituição, a esmagadora maioria dos inquiridos opera em instituições privadas 91.9% (n = 295)
e apenas 8.1% (n = 26) em instituões públicas. A respeito do vínculo contratual 45.2% (n = 145)
aufere de contrato sem termo, 44.5% (n = 143) de contrato com termo, 4.7% (n = 15) referiram outro,
2.5% (n = 8) são trabalhadores independentes e 3.1% (n = 10) não responderam. Cerca de 97.2% (n
= 312) dos participantes trabalha em regime de full-time ao passo que 2.8% (n = 9) trabalha em
regime de part-time. Relativamente à flexibilidade horária, 82.9% (n = 266) considera a sua chefia
facilitadora nesta vertente, enquanto 11.8% (n = 38) destaca a ausência de tolerância por parte dos
seus superiores na flexibilização do horário laboral, 5.3% (n = 17) dos participantes não respon-
deu. Finalizando, 63.9% (n = 205) dos trabalhadores revela não possuir isenção horária, 28.3% (n =
91) afirma possuir e 7.8% (n = 25) não se pronunciaram.
5.2. Instrumentos
Este estudo contemplou os seguintes instrumentos:
Workaholism – Com o intuito de avaliar o perfil do sujeito workaholic recorreu-se ao uso da
WorkBat de Spence e Robbins (1992), cuja adaptação para a população portuguesa foi feita por
Santos et al. (2018). Esta escala é constituída por 25 itens que avaliam três dimensões: o envolvi-
mento psicológico com o trabalho (8 itens, e.g., item 1 “Quando tenho tempo livre gosto de relaxar
e de não fazer nada importante”); a compulsão interna para trabalhar (7 itens, e.g., item 11 “Sinto
o dever de trabalhar arduamente, mesmo quando não é agradável) e o prazer derivado do trabalho
(10 itens, e.g., item 22 “Perco a noção do tempo quando estou envolvido(a) num projeto”). A cotação
das perguntas é feita numa escala do tipo Likert de 7 pontos (1 – discordo totalmente a 7 – con-
cordo totalmente), sendo importante referir que os itens 1,2,3,21 são passíveis de reversão. Os
autores da versão Portuguesa obtiveram valores de alfa que variaram entre 0.56 para a dimen-
são envolvimento, 0.82 para a dimensão compulsão e 0.76 para a dimensão prazer (Santos et al.,
2018). Neste estudo o valor de alfa foi de 0.45 para a dimensão envolvimento, 0.79 para a dimen-
são compulsão e 0.81 para a dimensão prazer.
Bem-estar psicológico – A avaliação desta variável teve por base a escala GHQ12 (Goldberg
& Williams, 1988). É uma medida de cater unidimensional, que se debruça sobre a avaliação
da saúde mental dos participantes, sendo composta por 12 itens que são avaliados através de
uma escala do tipo Likert com 7 pontos (1 – discordo totalmente a 7 – concordo totalmente). Esta
escala foca-se essencialmente em duas questões: a incapacidade para o desempenho de funções
normais bem como o surgimento de experiências inovadoras e angustiantes. O processo avalia-
tivo é feito no sentido inverso, desta maneira quanto maiores os valores de média menor será o
bem-estar psicológico experienciado pelo sujeito. Os autores originais obtiveram um valor de
consistência interna fixado em 0.83 (Goldberg & Williams, 1988). Neste estudo a escala apresen-
tou um valor de consistência interna de 0.64.
Escala de Conflito trabalho-família e família-trabalho – No que toca às escalas de conflito
trabalho-família e conflito família-trabalho, foi feita uma adaptação à população portuguesa por
Santos e Gonçalves (2014), tendo o seu desenvolvimento original em inglês sido concretizado por
Netemeyer et al. (1996). Esta escala é constituída por 10 itens, cuja cotação é feita numa escala
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do tipo Likert de 7 pontos (1 – discordo totalmente a 7 – concordo totalmente). Este instrumento
tem um caráter bidimensional, procurando avaliar as duas dimensões correspondentes ao con-
flito: o conflito trabalho-família (5 itens, e.g., item 1: “As exigências do meu emprego interferem na
minha vida familiar; item 4: “O meu emprego não permite ausências por motivos familiares”) e o
conflito família-trabalho (5 itens, e.g., item 7: “Prescindo de realizar tarefas profissionais pelos com-
promissos familiares em casa; item 9: “A minha vida familiar interfere com as minhas responsabili-
dades profissionais, nomeadamente na pontualidade, no cumprimento das tarefas diárias e nas horas
extraordinárias”). Relativamente à consistência interna, os autores da versão portuguesa obtive-
ram um valor de 0.86. No que concerne às suas dimensões, os valores oscilaram entre 0.88 para o
conflito trabalho-família e 0.87 para o conflito família-trabalho (Santos & Gonçalves, 2014). Neste
estudo os valores de alfa obtidos foram de 0.85 para a dimensão conflito trabalho-família e de
0.84 para a dimensão conflito família-trabalho.
Dados Sociodemográficos – No sentido de complementar as escalas referidas anteriormente
recorreu-se ao uso de um conjunto de questões que visam a caraterização da amostra recolhida
(e.g., idade, género, habilitações literárias, profissão, tipo de horário e vínculo contratual).
5.3. Procedimento
De modo a proceder à recolha dos dados necessários para a realização da investigação foi
elaborado um questionário self-reported em formato Word, posteriormente convertido num ques-
tionário de preenchimento online. Esta ferramenta avaliativa foi elaborada através da plataforma
Google Forms, tendo sido garantido o anonimato e a confidencialidade da mesma. O link do ques-
tionário foi difundido pelas mais diversas vias digitais, já o questiorio em formato papel foi
entregue a imeras entidades sediadas na região algarvia. No questionário em formato papel
foram contabilizadas as respostas de (n = 166) participantes, enquanto no questionário online
foram validadas (n = 155) participações. De referir que cada questionário apresentava uma sec-
ção inicial explicativa no sentido de esclarecer os inquiridos acerca do projeto/objetivo de inves-
tigação, bem como o consentimento informado de participação no estudo.
5.4. Análise de dados
Após a recolha dos dados, procedeu-se à extração das respostas para uma folha de cálculo
do Microsoft Office Excel, para que posteriormente fosse possível iniciar o processo de análise
de dados com recurso ao software SPSS (Statistical Package for Social Sciences), versão 26.0. Foram
realizadas inúmeras metodologias nomeadamente a análise da estatística descritiva, alise da
consistência interna, alise correlacional entre variáveis, testes t para avaliação de diferenças
de médias, análises de regressão e análise moderadora no sentido de testar as hipóteses investi-
gacionais estabelecidas.
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6. Resultados
6.1. Estatística Descritiva
Na tabela 1 encontram-se as médias e desvios-padrão das variáveis em estudo, bem como as
médias de acordo com o género. Destacam-se as variáveis bem-estar (M = 4.31; DP = 0.76) e com-
pulsão (M = 4.21; DP = 1.27), sendo aquelas que apresentam os valores de média mais elevados.
Em sentido inverso o conflito família-trabalho (M = 1.99; DP = 1.13) representa a variável com a
média mais baixa.
No que concerne à variável workaholism, esta apresenta um valor de média fixado nos 4.11
(DP = 0.75). Das três dimensões que a compõem, a compulsão é aquela que possui a média mais
elevada (M = 4.21; DP = 1.27) relativamente ao envolvimento psicológico (M = 4.06; DP = 0.85) e
ao prazer (M = 4.07; DP = 1.12). Significa isto que os sujeitos executam as suas funções laborais
não pelo prazer proporcionado pelas mesmas, mas sim pela sua forte obsessão em concretizá-las.
Relativamente à variável conflito trabalho-família/falia-trabalho, esta evidencia uma
média de 2.54 (DP = 1.13). Por sua vez a dimensão conflito trabalho-família detém um valor de
média superior (M = 3.08; DP = 1.48) quando comparado com o conflito família-trabalho (M =
1.99; DP = 1.13). Mediante esta assunção é legítimo concluir que os sujeitos envolvidos na pre-
sente investigação, consideram que as exigências do meio laboral interferem na gestão das res-
ponsabilidades profissionais e familiares.
6.2. Diferenças ao nível do género
Com o intuito de analisar quaisquer possíveis diferenças que pudessem existir entre géne-
ros, foram realizados testes t para amostras independentes. De acordo com os dados obtidos
verificaram-se diferenças estatisticamente significativas ao nível da variável workaholism (t
(317)
= -4.064, p ≤. 001) apresentando os homens valores de média mais elevados (M = 4.32; DP = 0.75)
quando comparados com as mulheres (M = 3.98; DP = 0.71). No que diz respeito às dimensões
desta variável, verificaram-se igualmente diferenças significativas no envolvimento psicológico
(t
(317)
= -3.888, p ≤. 001), compulsão (t
(317)
= -2.334, p = .020) e prazer (t
(317)
= -2.520, p = .012), sendo
que nos três casos os homens apresentam médias superiores em relação às mulheres. Para as res-
tantes variáveis do estudo, nomeadamente o conflito trabalho-falia/família- trabalho (t
(317)
=
-1.660, p = .098) e o bem-estar (t
(317)
= -1.737, p = .083) não se verificaram a existência de diferenças
estatisticamente significativas ao nível do género
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Workaholism, conflito trabalho-família e bem-estar
TABELA1
Médias e desvios-padrão das variáveis em estudo
Variáveis
Total Feminino Masculino
M DP M DP M DP
Conito TF-FT
2.54 1.13 2.45 1.08 2.66 1.18
Conito TF 3.08 1.48 3.00 1.45 3.21 1.52
Conito FT 1.99 1.13 1.89 1.05 2.12 1.22
Workaholism
4.11 0.75 3.98 0.71 4.32 0.75
Envolvimento 4.06 0.85 3.92 0.78 4.29 0.89
Compulsão 4.21 1.27 4.08 1.29 4.42 1.22
Prazer 4.07 1.12 3.96 1.05 4.27 1.17
Bem-estar
4.31 0.76 4.26 0.75 4.41 0.77
6.3. Análise Correlacional
Na tabela 2 é possível observar os valores das correlações entre as variáveis em estudo.
Oconflito trabalho-família/família-trabalho contempla uma correlação positiva forte e estatis-
ticamente significativa com as dimenes que a compõem, nomeadamente o conflito trabalho-
-família (r = .899, p .001) e o conflito família-trabalho (r = .818, p .001). Numa outra vertente,
esta mesma variável ilustra uma correlação positiva muito fraca e estatisticamente significativa
com o workaholism (r = .113, p = .043), verificando-se uma correlação positiva muito fraca com
as dimensões compulsão (r = .207, p ≤ .001) e prazer (r = .053, p = .342) sendo esta última não sig-
nificativa dado o valor apresentado de p value. Quanto à dimensão envolvimento, é de destacar
a existência de uma relação correlacional negativa muito fraca, mas não significativa (r =-.040,
p = .480). Relativamente ao bem-estar, a variável conflito trabalho-família/família-trabalho
manifesta uma correlação positiva muito fraca, sendo, contudo, estatisticamente significativa
(r= .211, p ≤ .001).
No que concerne à variável workaholism, esta estabelece correlações positivas e significati-
vas com todas as suas dimenes. No envolvimento psicológico (r = .582, p .001) a intensidade
da correlação é moderada, no caso da compulsão (r = .690, p .001) e do prazer (r = .770; p .001) é
forte. A relação desta variável com o bem-estar traduz-se por uma correlação positiva moderada
e estatisticamente significativa (r = .433; p ≤ .001).
Finalizando com o bem-estar, a variável sustenta correlações positivas muito fracas, mas
estatisticamente significativas com o conflito trabalho-família (r = .207, p ≤ .001) e conflito famí-
lia-trabalho (r = .153), p .001). Verifica-se igualmente uma relação correlacional positiva muito
fraca, com as dimenes envolvimento (r = .143; p .001) e prazer (r = .266; p .001), sendo que no
caso da compulsão (r = .470, p ≤ .001) a intensidade é moderada. De referir que todas as relações
da variável bem-estar com as dimensões que compõem o workaholism são significativas.
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TABELA2
Análise Correlacional
Variáveis 1. 1.1. 1.2. 1.3. 2. 2.1. 2.2.
1. Workaholism
-
1.1. Envolvimento .582** -
1.2. Compulsão .690** .227** -
1.3. Prazer .770** .182** .223** -
2. Conito TF-FT
.113** .040* .207** .053* -
2.1. Conito TF .087* .031* .200** .009* .899** -
2.2. Conito FT .114** .036* .153** .095* .818** .484** -
3. Bem-estar
.433** .143** .470** .266** .211** .207** .153**
6.4. Análise de regressão
Com o intuito de testar as hipóteses investigacionais estabelecidas procedeu-se ao uso de
análises de regressão linear simples e múltipla. Para averiguar o efeito do workaholism sobre
o conflito trabalho-família foram realizados quatro modelos (tabela 3). Relativamente ao poder
preditivo das varveis em estudo, o primeiro modelo explica 5% do conflito trabalho-família,
o segundo modelo explica 1.2%, o terceiro modelo explica 3.8% e o quarto modelo explica 4.1%.
Apenas o terceiro e o quarto modelos se revelaram estatisticamente significativos (p = .002),
salientando-se nesse sentido o quarto modelo pelo seu poder preditor, contudo nenhuma das
variáveis sustem significância estatística. Desta maneira considerou-se para fins de análise o
modelo três, sendo a dimensão compulsão a única varvel com um contributo significativo.
TABELA3
Predição do Workaholism sobre o CTF
Modelos
CTF
r
2
ΔR
2
p
1. Workaholism
.008 .005 .118
2. Workaholism + Env.
.018 .012 .057
3. Workaholism + Env. + Comp.
.047 .038 .002
4. Workaholism + Env. + Comp. + Prazer
.053 .041 .002
Na predição do workaholism sobre o conflito família-trabalho foram igualmente aplicados
quatro modelos (Tabela 4). O modelo um explica 1.0% do conflito família-trabalho, o modelo dois
explica 2.3%, o modelo três explica 2.4% e o modelo quatro explica 4.0% sendo todos estatisti-
camente significativos. O quarto modelo é aquele que mais se destaca em virtude do seu poder
preditivo, tendo sido constatado um contributo significativo de todas as variáveis incluídas.
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Workaholism, conflito trabalho-família e bem-estar
TABELA4
Predição do Workaholism sobre o CFT
Modelos
CFT
r
2
ΔR
2
p
1. Workaholism
.013 .010 .042
2. Workaholism + Env.
.029 .023 .010
3. Workaholism + Env. + Comp.
.034 .024 .013
4. Workaholism + Env. + Comp. + Prazer
.052 .040 .002
Na testagem do efeito do workaholism sobre o bem-estar aplicaram-se quatro modelos pro-
cedendo-se da mesma maneira que nas outras variáveis previamente enunciadas (Tabela 5). Os
resultados revelaram que todos os modelos são estatisticamente significativos (p ≤.001) sendo
que o primeiro modelo explica 18.1% do bem-estar, o segundo modelo explica 20.1%, o terceiro
modelo explica 24.1% e o quarto modelo explica 23.9%. No modelo três, que se apresenta como o
maior preditor, somente a dimensão envolvimento não manifesta um contributo estatisticamente
significativo (p =.165).
TABELA5
Predição do Workaholism sobre o bem-estar
Modelos
Bem-estar
r
2
ΔR
2
p
1. Workaholism
.188 .185 <.001
2. Workaholism + Env.
.206 .201 .000
3. Workaholism + Env. + Comp.
.248 .241 .000
4. Workaholism + Env. + Comp. + Prazer
.249 .239 .000
Na predição do conflito família-trabalho/trabalho-família sobre o bem-estar procedeu-se à
elaboração de dois modelos (Tabela 6). Os resultados mostraram que o modelo um explica 4.0% do
bem-estar e o modelo dois explica 4.1%, sendo ambos estatisticamente significativos. No modelo
dois, enquanto maior preditor, apenas a dimensão conflito trabalho-família é estatisticamente
significativa (p =.006).
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TABELA6
Predição do CFT-CTF sobre o bem-estar
Modelos
Bem-estar
r
2
ΔR
2
p
1. CTF .043 .040 <.001
2. CTF + CFT .047 .041 .001
Para analisar o poder preditor das variáveis workaholism e conflito trabalho-família/família-
-trabalho sobre o bem-estar, foram produziram-se dois modelos (Tabela 7). Ambos são estatisti-
camente significativos (p . 001). O modelo um explica 18.5% do bem-estar ao passo que o modelo
dois explica 20.9%. No modelo dois as variáveis incluídas assumem significância estatística.
TABELA7
Predição do Workaholism e do CFT-CTF sobre o bem-estar
Modelos
Bem-estar
r
2
ΔR
2
p
1. Workaholism
.188 .185 <.001
2. Workaholism + CTF-CFT
.214 .209 .000
6.5. Análise de moderação
A análise moderadora teve como objetivo observar se o género afeta a direção ou a intensi-
dade da relação entre o workaholism, conflito TF-FT e bem-estar. Para tal foram realizados três
modelos. Nenhum dos modelos se apresentou como estatisticamente significativo. O primeiro
modelo (Tabela 8) apresenta os valores de moderação entre a variável independente workaholism,
a variável dependente CTF-FT e a variável moderadora género (p = .68).
TABELA8
Análise de moderação – Workaholism com CFT-CFT por género
coef ep
t p
IC 95%
Constant
2.16 1.09 1.97 .048 .012 – 4.32
Workaholism
.032 .265 .123 .902 -.489 – .555
Género
-.133 .739 -.180 .857 -1.58 – 1.32
Int_1
.071 .174 .412 .680 -.271 – .415
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Workaholism, conflito trabalho-família e bem-estar
O segundo modelo mostra os valores obtidos para a análise de moderação entre workaho-
lism e bem-estar por género. Embora este modelo explique cerca de 18.77% do bem-estar (F
(3,313)
= 24.109, p = .000), a moderação do género não é estatisticamente significativa (R
2
= .38, p = .22)
(Tabela 9).
TABELA9
Análise de moderação – Workaholism com bem-estar por género
coef ep
t p
IC 95%
Constant
3.28 .672 4.89 .000 1.96 – 4.61
Workaholism
.249 .162 1.53 .126 -.070 – .570
Género
-.536 .453 -1.18 .238 -1.42 – .356
Int_1
.129 .107 1.20 .228 -.081 – .340
O terceiro modelo realizado contempla a variável CFT-FT como variável independente e o
bem-estar como variável dependente. É um modelo que explica 5.19% do bem-estar (F
(3,313)
= 5.70,
p = .001), contudo o género não se apresenta como moderador significativo estatisticamente (R
2
=
0.06, p = .65) (Tabela 10).
TABELA10
Análise de moderação – Conflito TF-FT com bem-estar por género
coef ep
t p
IC 95%
Constant
3.92 .314 12.46 .000 3.30 – 4.54
CFT-FT
.090 .115 .785 .432 -.136 – .316
Género
.035 .210 .169 .865 -.378 – .449
Int_1
.033 .075 .442 .658 -.114 – .180
7. Discussão dos resultados
Tal como referido anteriormente a presente investigação debruçou-se na análise do efeito do
workaholism sobre o conflito trabalho-família/família-trabalho bem como o efeito destas variá-
veis sobre o bem-estar. Procurou-se igualmente averiguar se o género é moderador da relação
entre o workaholism, o conflito trabalho-família/família-trabalho e o bem-estar.
A primeira hipótese (H1), “O workaholism influencia o conflito trabalho família/família-tra-
balho, foi confirmada. A análise correlacional evidenciou a existência de uma relação muito
fraca, mas estatisticamente significativa, entre a variável workaholism e o conflito trabalho-fa-
mília/família-trabalho. No que concerne às dimensões do conflito, observou-se uma relação
muito fraca e estatisticamente significativa somente entre o workaholism e a dimensão conflito
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família-trabalho. Na análise da regressão linear os resultados indicaram que o workaholism
explica 1% da dimensão conflito falia-trabalho, apresentando significância estatística unica-
mente com esta dimensão. A literatura existente enaltece que os comportamentos característicos
de um workaholic são determinantes na manifestação de situações de conflito entre os domínios
laboral e familiar. Desta feita, a obsessão excessiva pelo trabalho, impossibilita o estabelecimento
de um ponto de equilíbrio entre domínios (Tahir & Aziz, 2019). Em termos de género verificaram-
-se apenas diferenças estatisticamente significativas ao nível do workaholism e respetivas dimen-
sões, sendo que os homens apresentam médias superiores quando comparados com as mulheres.
Nos estudos desenvolvidos em torno desta temática prevalecem as diferenças na forma como o
workaholism se expressa entre homens e mulheres, tal facto é de certa maneira expectável dado
que as mulheres são encaradas como as principais responsáveis pelo contexto familiar (Carli &
Eagly, 2012). É inclusive esperado que a experiência workaholic das mulheres apresente um maior
grau de complexidade, uma vez que necessitam de gerir não só o clima familiar como também o
seu vício pelo trabalho excessivo (Beiler-May et al., 2017).
A segunda hipótese (H2) “O workaholism influencia o bem-estar”, foi confirmada através de
uma relação positiva moderada e estatisticamente significativa entre as variáveis. O estado da
arte revela alguma incoencia relativamente a esta questão. Os sujeitos workaholic caraterizam-
-se habitualmente como infelizes e compulsivos, sendo de realçar os baixos níveis de bem-estar
e os elevados níveis de conflito experienciados (Shimazu et al., 2015). Em sentido inverso alguns
teóricos consideram que esta obsessão excessiva pelo trabalho pode ser visualizada positiva-
mente, mediante a expressão de sentimentos de satisfação laboral, commitment e bem-estar por
parte dos sujeitos (Gillet et al., 2018).
A terceira hipótese (H3) “O conflito trabalho-família influencia o bem-estar” foi confirmada,
mediante uma correlação positiva fraca e significativa entre o conflito trabalho-família/família-
-trabalho e o bem-estar. Relativamente às suas dimensões, conflito trabalho-família estabelece
uma relação positiva fraca e significativa com o bem-estar, já no caso do conflito família-trabalho
a relação é positiva muito fraca, mas igualmente significativa. A análise de regressão demonstrou
que o conflito trabalho-família/família-trabalho explica 4.1% do bem-estar. O estado de arte esti-
pula que o conflito entre domínios influencia vivamente o bem-estar dos trabalhadores, ou seja,
será de esperar que as horas excedentárias dedicadas ao trabalho, com vista ao sustento familiar,
produzam consequências negativas (McDowell et al., 2019). Deste modo a depressão, a ansiedade
e até mesmo o burnout são alguns exemplos de problemas de saúde que interferem com a satisfa-
ção laboral e familiar dos sujeitos (Rafique et al., 2018).
A quarta hipótese (H4) “O género é moderador da relação entre workaholism e o conflito
trabalho-família/família-trabalho não foi confirmada. A alise moderadora demonstrou que
o género não se assume enquanto moderador significativo da relação entre o workaholism e o
conflito trabalho-família/família-trabalho. Atualmente são escassos os estudos desenvolvidos
que forneçam suporte na identificação de variáveis moderadoras desta relação (Williamson &
Clark, 2017). Tanto a raça como o género apresentam-se como possíveis moderadores, no entanto,
não existem dados suficientes que permitam afirmar que moderem significativamente a relação
entre o workaholism e o conflito trabalho-família/família-trabalho (Aziz et al., 2010; Bakker et al.,
2009; Shimazu et al., 2011). Apesar do referido é importante ressalvar que são esperadas intera-
ções quando se procede à análise de constructos multidimensionais, ou seja, enquanto modera-
dor, o vínculo estabelecido entre o workaholism e o conflito trabalho-família/família-trabalho é
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Workaholism, conflito trabalho-família e bem-estar
passível de manutenção sem a presença do género, uma vez que este somente interfere na rela-
ção entre as variáveis (Aziz & Cunninghan, 2008).
A hipótese 5 (H5) “O género é moderador da relação entre workaholism e bem-estar” não se
confirmou. A alise moderadora revelou que o género não se apresenta como moderador da
relação entre o workaholism e o bem-estar. Segundo Clark et al. (2015) as mulheres workaholic
deparam-se frequentemente com uma pressão extra decorrente da necessidade de equilibrar o
domínio laboral com o familiar em parte devido à manutenção dos valores tradicionais que enfa-
tizam a responsabilidade da mulher para com a família (Blair-Loy, 2003; Powell & Greenhaus,
2010). Perante esta exigência, será de esperar que experienciem mais outcomes negativos ao nível
da sua saúde e bem-estar, que poderão traduzir-se na expressão simultânea de estados emocio-
nais negativos (Johnson & Whisman, 2013). Apesar de o workaholism se manifestar em ambos
os sexos, no caso das mulheres são esperadas mais consequências negativas decorrentes do seu
vicio (Balducci et al., 2016).
Por fim a hipótese 6 (H6) “O género é moderador da relação entre o conflito trabalho-famí-
lia/família-trabalho e o bem-estar” não foi confirmada. Tal como referenciando anteriormente,
alguns estudos não constatam a existência de diferenças de género relativamente ao conflito
trabalho-família/família-trabal